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No português existem três palavras que se escrevem quase da mesma forma. São falo (do verbo falar), falo (pénis/pênis, do latim phallus), e fá-lo (do ênclise faz + o). O meu professor disse-me que não usasse fá-lo porque segundo ele, a gente entendê-lo-ia como falo (de phallus) e por isso a gente já só usa fá-lo em textos muito formais e usa o faz na fala, mesmo em Portugal onde a ênclise é mais comum.

Pronunciam-se de forma diferente ou distinguem-se só por contexto? É possível os falantes nativos confundirem uma destas palavras com outra e então as evitarem?

Jacinto
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user0721090601
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Primeira pergunta: pelo menos no Brasil, as três são pronunciadas exatamente da mesma maneira. Creio que o mesmo valha para Portugal, mas não tenho certeza.

No caso do português brasileiro, tanto o substantivo "falo" quanto a forma "fá-lo" são bastante incomuns em fala corriqueira, e diria que a maioria das pessoas não associaria esses sons a algo além do verbo "falar" na primeira pessoa do presente do indicativo. Dessa forma, sim, provavelmente alguma confusão pode ocorrer. Porém, acho pouco provável que "falo" fosse entendida como o substantivo, especialmente se usada num contexto onde o verbo é óbvio. Pelo contrário: se alguém usasse esse som num sentido diferente do verbo, provavelmente o faria num contexto onde o sentido desejado fosse muito evidente.

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Fá-lo do verbo fazer, falo do verbo falar e o substantivo falo pronunciam-se da mesma maneira em todo o lado, mas dificilmente gerarão confusão, principalmente o substantivo com as outras. Existem no Português mais de cem substantivos que coincidem com formas de verbos, e não me lembro de alguma vez ter compreendido mal ou ter visto alguém compreender mal. Talvez brincadeiras com palavras escolhidas a dedo como não cobres muito por esse cobre que já nada cobre gerem alguma perplexidade inicial. Além do mais falo com o significado de pénis é pouco usado.

Eu tenho a impressão que fá-lo é pouco usado na linguagem informal em Portugal, mas outros portugueses exprimiram aqui a opinião contrária. E depois de consultar um Corpus do Português cheguei à conclusão que fá-lo é muito mais frequente, na escrita, que qualquer outro verbo na mesma conjugação (olha-o vem num distante segundo lugar). Isto é em parte por o verbo fazer ser mais comum que os outros, mas não é só isso: fá-lo ocorre 168 vezes em cada mil ocorrências de fazê-lo enquanto a média para outros verbos é só 91. Curiosamente no Brasil é o contrário: os números correspondentes são 18 para fá-lo e 61 para a média dos outros verbos (os outros verbos que eu vi são trazer, dizer, tomar, apanhar, comer, ver, ouvir, escutar e olhar). Agora isto é na escrita. Na fala poderá ser algo diferente, até porque fá-lo, tal como trá-lo e di-lo são formas irregulares, e há até quem não as saiba bem ou tenha crescido com formas alternativas: faze-o, traze-o e dize-o.

Quanto a substituir fá-lo por o faz, isso é possível no Brasil (exceto na norma culta quando a frase começa pelo verbo), mas não em Portugal. O teu professor está enganado a esse respeito. No exemplo seguinte:

"Quem é que faz o bolo?" pergunta a Ana. "Fá-lo o Miguel, que tem jeito para bolos," sugere o Paulo.

em Portugal não é possível, ou pelo menos nunca ouvi, "O faz o Miguel ..." É possível, pelo menos informalmente, omitir o pronome e dizer "Faz o Miguel..." Noutros contextos, fá-lo pode ser substituído por faz isso:

Alguém tem que que explicar a situação ao tio.

O João fá-lo = o João faz isso.

Mas repito, estas alternativas a fá-lo não resultam do receio de confusão com o substantivo falo. Se fosse assim, o que é que faríamos com o falo de falar. Ainda por cima, neste caso a possibilidade de confusão existiria, não só na fala, mas também na escrita!

Jacinto
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  • É interessante as formas trá-lo/di-lo, etc, serem consideradas eruditas. Ao menos no asturiano, estos verbos aparecem com frequência com pronome direito enclítico: failo (fá-lo), dizlo (di-lo). É simplesmente que os luso-falantes evitem os pronomes em geral nestas situações (seja o verbo o que for)? – user0721090601 Sep 04 '15 at 13:48
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    Erudito é uma força de expressão (e não existe um forma "popular" alternativa). São pouco usadas na linguagem informal. Talvez por esses verbos, fazer, trazer e dizer, terem um conjugação irregular. Já com verbos regulares o a conjugação pronominal me parece mais comum come-o, mata-o, apanha-o. Mas tem em conta que outro português, @JorgeB. diz que usa fá-lo frequentemente. Mas podes usá-lo à vontade, que ninguém, mas ninguém, vai pensar que estás a fazer alusões impróprias. – Jacinto Sep 04 '15 at 13:56
  • Se fizerem um estudo a respeito, acho que 90% da população brasileira não conhece o significado "pênis" para a palavra "falo". Vinte milhões de brasileiros (10% da população) devem saber. – Centaurus Sep 04 '15 at 15:54
  • @Centaurus lol não me admiraria que se obtivesse o mesmo resultado em Portugal. – Jacinto Sep 04 '15 at 16:16
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    Não sei em que círculos se movem em que "fá-lo" possa alguma vez ser considerado erudito. Entre pessoas com menos educação às vezes ouve-se "faze-o" (mas é curioso que a forma mais culta é "quere-o", não "qué-lo"), mas de resto toda a gente diz "fá-lo", ou quando muito substitui por qualquer coisa como "faz isso". – Artefacto Sep 04 '15 at 19:21
  • @Artefacto Eu cresci no campo com os faze-os. Não é assim tão curioso: à norma culta tu quere-lo corresponde a 'norma popular' tu querze-o. Há divergência quando a flexão do verbo acaba em s ou z, – Jacinto Sep 04 '15 at 21:13
  • @Jacinto Estava a falar da 3a pessoa (para ser análogo a "fá-lo"). "Quere-lo" é 2a pessoa. – Artefacto Sep 04 '15 at 21:37