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A seguintes frases estão corretas:

(1) Ele tem sempre vivido em sociedade.
(2) Ele tem vivido sempre em sociedade.
(3) Ele sempre viveu em sociedade.
(4) Ele viveu sempre em sociedade.

Diria que (1) significa ele viveu, desde que há memória, por norma e até agora, em sociedade, (2) admite a mesma leitura que (1), mas é possível lê-la também como "ultimamente, ele tem vivido ininterruptamente em sociedade", (3) não tem noção durativa e podemos admitir que não viveu em sociedade até agora mas até algum ponto no passado (especialmente recente) e (4) é mais facilmente lida como até um ponto num passado distante (por exemplo, já morreu há vários anos).

Mas esta não me soa bem:

Ele sempre tem vivido em sociedade.

No entanto, admito as seguintes, embora algumas pareçam inversões da ordem normal:

Como sempre tem acontecido, ...
Confirmando o que a família sempre tem defendido, ...
Apesar de aliada de Washington na Nato, a França sempre tem feito questão de diversificar os seus laços, ...

Porquê?

Artefacto
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  • Eu não me vou atrever a fazer uma resposta por não ter fundamentos, mas diria que é porque nesse caso o sempre fica diretamente ligado com o tem e não com vivido, que será a ideia que se quer passar, como tem sempre vivido**. – Jorge B. Oct 05 '15 at 12:47
  • @JorgeB. Não tenho a certeza desse facto. A minha sensibilidade é no sentido de que em "tem sempre vivido", "sempre" qualifica "tem" (pela forma como as duas palavras se podem pronunciar mais juntas), não vivido (portanto qualificará TT, ou FIN-time na terminologia de Klein 1992). E não sei se em "tem vivido sempre" "sempre" qualifica "vivido" ou a expressão inteira "tem vivido". – Artefacto Oct 05 '15 at 13:07
  • (cont.) Ou porque pôr o "sempre" antes funciona (aparentemente) se o aspeto for iterativo, mas não na frase do título ou em "*eu sempre tenho sido bom", em que "tenho sido" tem aspeto durativo. – Artefacto Oct 05 '15 at 13:08

3 Answers3

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O problema é que não se usa o advérbio "sempre" em uma frase no Pretérito Perfeito Composto (PPC). Seria melhor, em todos os seus exemplos, utilizar o Pretérito Perfeito Simples (PPS):

"Ele sempre viveu em sociedade."

"Como sempre aconteceu, ..." "Confirmando o que a família sempre defendeu, ..." "Apesar de aliada de Washington na Nato, a França sempre fez questão de diversificar os seus laços..."

O PPC também não soa correto com os advérbios "nunca", "ainda não" e "já". Se você utilizar esse advérbios com o PPC, a ideia de tempo fica confusa pois dá a ideia de 2 significados temporais diferentes.

Emerson
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  • Obrigado pela resposta, mas parece-me que ela essencialmente reformula a pergunta (petitio principii). Além disso, ninguém diria que "como sempre tem acontecido, ..." está errado ou sequer soa mal. O último parágrafo diz qualquer coisa, mas precisaria de ser muito mais desenvolvido (por exemplo: quais são esses dois significados?, porque é que estar à frente faz diferença?). – Artefacto Oct 05 '15 at 16:06
  • Também não estou completamente convencido de que não se possam usar esses advérbios, especialmente "já". Exemplos do CETEMPúblico: "Em Freixo de Espada à Cinta ainda não temos tido problemas com o abastecimento de água, mas...", "Desde o último sábado, e por razões sempre diferentes, Jorge Sampaio nunca tem falhado.", "a malta já tem falado nisso, mas depois ninguém faz nada". – Artefacto Oct 05 '15 at 16:12
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Ele sempre tem vivido em sociedade também não me soa bem, mas as frases seguintes já passam:

(a) Anda outra vez com problemas de dinheiro, que é como ele sempre tem vivido.
(b) Pois é esta vida dura que ele sempre tem vivido.

Do mesmo modo

(c) Isto sempre tem acontecido.
(d) A família sempre tem defendido isto.

Não me soam tão bem como:

(e) Aconteceu outra vez, como sempre tem acontecido.
(f) Concluiu-se que não foi suicídio, confirmando o que a família sempre tem defendido.

Ou seja, parece-me que é o como e o que que tornam o adiantamento do sempre mais natural.

Acho possível a diferença apontada entre (3) e (4): que sempre viveu possa sugerir um passado mais recente que viveu sempre. Mas isso é pelo contexto que cada uma me sugere. Para mim o sempre ganha ênfase ao ser adiantado na frase, sugerindo até alguém a rebater algo dito por outrem, o que sugere uma pessoa mais próxima dos conversantes, talvez ainda viva:

"A certa altura ele passou a viver mais em sociedade." — "Ele sempre viveu em sociedade!"

Ele viveu sempre em sociedade parece-me mais neutro. Talvez seja também a questão da ênfase que torna mais natural as frases (a), (b), (e) e (f): os contextos sugerem uma enfatização do sempre.

Para além de sempre ganhar ênfase com o adiantamento, não vejo quailquer diferença entre sempre viveu e viveu sempre ou entre tem vivido sempre, tem sempre vivido e sempre tem vivido.

Jacinto
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Vejamos como fica com outros exemplos:

  1. Ele tem sempre vivido em São Paulo.
  2. Ele tem vivido sempre em São Paulo.
  3. Ele sempre viveu em São Paulo.
  4. Ele viveu sempre em São Paulo.

1 e 2 soam muito unusual. Não vejo uma situação onde eu usaria esses tempos verbais no contexto de "viver". Não percebo nenhuma diferença de significado entre 3 e 4.

Usos:

(a) "Você vive no Rio de Janeiro?"

(b) "Não, eu vivo em São Paulo."

(a) "Mas viveu no Rio de Janeiro durante algum tempo."

(b) "Não, eu sempre vivi em São Paulo." ou "Eu vivi sempre em São Paulo.

ou

(a) "Ele mora em Lisboa, certo?"

(b) "Não, ele mora no Faro."

(a) "Mas morou em Lisboa quando era jovem?"

(b) "Não, ele sempre morou no Faro" ou "Ele morou sempre no Faro"

ou

(a) "Ele foi pontual?"

(b) "Não, ele chegou atrasado."

(a) "Mas ele costumava ser pontual, não?

(b) "Ele sempre chegou atrasado." ou "Ele chegou sempre atrasado."

Não vejo diferença alguma entre as duas formas acima. Contudo, não consigo imaginar um brasileiro falando:

  • "Ele tem sempre vivido em São Paulo". ou "Ele tem vivido sempre em São Paulo."
  • "Ele tem sempre morado no Faro." ou "Ele tem morado sempre no Faro."

Mas consigo imaginar:

  • "Ele sempre tem chegado atrasado"
  • "Ele tem chegado sempre atrasado"

ou

  • "Eu tenho sempre sido bom p'ra ela."
  • "Eu tenho sido sempre bom p'ra ela."

O primeiro dos dois últimos exemplos dá a sensação de que ele não costumava chegar sempre atrasado. Atrasava uma vez ou outra, ou então não atrasava nunca. Mas passou a atrasar de algum tempo inespecificado até a presente data.

Da mesma forma o segundo exemplo transmite um significado de "ação habitual", que é repetida várias vezes até o presente momento. Esta forma verbal não pode ser usada para ações que só acontecem uma vez: viver, morrer, ser batizado, doar um rim, ser enterrado, etc.

Centaurus
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  • Posso dizer que em Portugal, "ele sempre chegou atrasado" é diferente de "ele chegou sempre atrasado". A primeira diz que era habitual (desde sempre) que ele chegasse atrasado, enquanto a segunda diz que "não houve uma única vez que ele deixado de chegar atrasado". A primeira deixa aberta a possibilidade de que ele tenha chegado a horas algumas vezes (mas não era esse o hábito). Concordo contigo no significado de "ele tem chegado sempre atrasado"/"ele sempre tem chegado atrasado". – Artefacto Oct 05 '15 at 16:20
  • De qualquer forma, escapaste à pergunta. Se não gostas do meu exemplo, podes usar "eu sempre tenho sido bom" vs "eu tenho sempre sido bom"/"eu tenho sido sempre bom". A questão é porque é que as útimas formas são admissíveis e a primeira não. – Artefacto Oct 05 '15 at 16:20
  • @Artefacto Editado. – Centaurus Oct 05 '15 at 16:29
  • Embora seja verdade que o PPC tenha geralmente um significado habitual/iterativo, este não tem de ser o caso. Podes ver este artigo, de resto brasileiro. Como esse artigo diz, pode ter um "aspeto durativo", que é o caso de "ele tem vivido bem", "tenho estado doente". E em todo o caso, por que é que a posição de "sempre" é relevante não ficou claro. – Artefacto Oct 05 '15 at 16:37