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No Brasil é muito comum usar “tem” no sentido de existir (em vez de ser no sentido de posse), embora na escola se ensine que nessa situação deve-se usar “há”.

O verbo haver nesse caso é impessoal (isso também é enfatizado na escola e nas gramáticas de português), portanto se diz: “há muitas coisas”, “houve vários transtornos”, “haverá diversas discussões” (e não hão/houveram/haverão).

Até aí, tudo bem. Mas apesar do que a escola prega e para o desprazer dos gramáticos, o uso de “tem” acaba fazendo parte da língua cotidiana e eu gostaria de saber se existe alguma recomendação da sua forma de uso — impessoal como o “há” ou pessoal como o próprio verbo ter em outras situações — ou se a gramática tradicional se abstém totalmente neste caso.

Por exemplo: “Tinha muitas coisas lá” ou “tinham muitas coisas lá”? “Teve vários transtornos” ou “Tiveram vários transtornos”?

Por analogia com o verbo haver, e também por intuição/costume, acho que o correto é manter o verbo no singular, por ser impessoal. Nas frases acima “muitas coisas” e “vários transtornos” são objetos e não sujeito.

Mas também tenho ouvido muitas pessoas usarem o plural, o que me parece um caso de hipercorreção, tentando fazer mais concordâncias verbais (ou nominais) do que o necessário. Isso sempre me soa bem errado, mas como o que estudei só trata do verbo haver, fico em dúvida. Algum autor/professor/etc. já se manifestou sobre isso?

marcus
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    Achei somente alguns sites: http://dicasdiariasdeportugues.com.br/a-concordancia-do-verbo-ter-no-sentido-de-existir/ http://soumaisenem.com.br/redacao/lingua-e-linguagem/o-uso-dos-verbos-ter-haver-e-existir – Leonardo Castro Feb 02 '16 at 14:00
  • Já é mais do que eu achei da última vez que pesquisei. :-) – marcus Feb 03 '16 at 15:40

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Tem vários sites que recomendam a conjugação só na terceira pessoa do singular, por exemplo, Não tropece na língua 289 e 046 (ênfase minha):

Tem mulheres que adoram “rodar a baiana”.

Tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu...” (Chico Buarque, Roda Viva)

Não encontrei nenhum site que recomendasse ou aceitasse o contrário. Nenhum destes sites cita qualquer gramático famoso. O argumento que eles apresentam é o mesmo que tu avanças. Nestes casos a oração não tem sujeito. Nos exemplos acima, mulheres e dias é o objeto direto do verbo e não o seu sujeito. Logo o verbo flexiona sempre na terceira pessoa do singular.

Exceto para o verbo ser, esta é a regra seguida nas orações sem sujeito na Nova Gramática do Português Contemporâneo de Celso Cunha e Lindley Cintra (2014, p. 168-70) não só para o verbo haver, mas também para o fazer e ir (ênfase minha):

Na sala havia ainda três quadros do pintor (Fernando Namora, Domingo à Tarde, 1975).

Faz hoje oito dias que comecei (Augusto Abelaira, Bolor, 1974).

Vai para uns quinze anos que escrevi uma crónica... (Manuel Bandeira, Poesia e prosa, 1958).

A Gramática observa então (p. 169):

Na linguagem coloquial do Brasil é corrente o emprego do verbo ter como impessoal, à semelhança de haver. Escritores modernos ― e alguns dos maiores ― não têm duvidado em alçar a construção à língua literária.

A Gramática apresenta alguns exemplos, mas o objeto direto é em todos singular, logo não dá para tirar as teimas. Mas o à semelhança de haver indica que eles estão a pensar na conjugação exclusivamente na terceira pessoa no singular.

Parece no entanto haver pessoas que acham mais natural a conjugação de acordo com o número do objeto direto. Vejam no dicas diárias do português, um dos sites que recomenda o uso impessoal, o comentário de uma jornalista (ênfase minha):

Difícil de entrar isso na cabeça, é tão certo para mim: tinham muitas pessoas no clube...

Jacinto
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  • Bem, que ótimo que não sou o único a preferir a forma impessoal! Obs.: O primeiro link não está funcionando. – marcus Feb 03 '16 at 15:33
  • @marcus Consertei o link. – Jacinto Feb 03 '16 at 17:23
  • É relativamente fácil perceber como é errôneo usar Tem, basta perguntar-se: "quem tem?" Aí nota-se a importância de usar Há ou Existem, que dá o sentido correto. – Eduardo Mar 04 '16 at 01:30
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O verbo haver, no sentido de existir, é impessoal. Dessa forma, ele não possui sujeito e se mantem no singular, no entanto, nem sempre essa situação é verdadeira! Algumas vezes, o verbo pode atuar como a um verbo auxiliar o que o torna sinônimo de "ter" em tempos compostos.

Exemplo:

Eles haviam chegado cedo

Eles tinham chegado cedo