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É comum ouvirmos aqui no Brasil, pelo menos no interior de Minas Gerais onde eu moro, a palavra "tava" com sentido de "estava".

Vi que existem algumas músicas com essa palavra:

(1) Na música Desenho de Deus de Armandinho:

Quando Deus te desenhou, ele tava namorando
Quando Deus te desenhou, ele tava namorando
Na beira do mar, na beira do mar do amor
Na beira do mar, na beira do mar do amor
Papai do céu na hora de fazer você[...]
Fonte: https://www.vagalume.com.br/armandinho/desenho-de-deus.html

Obs: o compositor arrumou até namorada para Deus...

(2) Na música Farinhada de Zé Dantas contada por Luiz Gonzaga e Elba Ramalho:

Tava na peneira eu tava peneirando
Eu tava num namoro eu tava namorando
Na farinhada lá da Serra do Teixeira
Namorei uma cabôca nunca vi tão feiticeira[...]
Fonte: https://www.letras.mus.br/elba-ramalho/767581/

É aceitável esse tipo de erro na língua coloquial falada?

Denis Caixeta
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  • "A chave tava com quem? em algumas construções talvez para evitar a chiadeira come-se o 'es' – André Lyra Jul 26 '16 at 12:43
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    Denis Caixeta e @AndréLyra em Portugal usa-me muito o tava, eu uso quase todos os dias, falado e escrito informalmente. Mas, formalmente é sempre estava. – Jorge B. Jul 26 '16 at 13:59
  • Mas a pergunta foi sobre 'língua coloquial falada'. – André Lyra Jul 26 '16 at 18:23
  • Na linguagem coloquial falada, o que é um erro? – eightShirt Jul 27 '16 at 15:40
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    @eightShirt Há muitas construções que são "erradas" (isto é, inaceitáveis) no coloquial. Exemplos: As casa é azuis. O viaduto desabamos. A reta rua é. Não vos chamei por que não estáveis ainda prontos. (Sim, essa última é aceitável no padrão, mas não no coloquial, a não ser num contexto de galhofa). – Luís Henrique Jul 27 '16 at 20:18
  • @LuísHenrique essa discussão é muito ampla. No meu ponto de vista, nada disso é inaceitável no coloquial, onde predominam espontaneidade e informalidade, bem como não há, necessariamente, preocupação com a gramática normativa, ao contrário da língua culta. De acordo com o professor Vicente Santos, "[...] nada é errado nem certo, ninguém fala bonito ou feio, fala diferente". Se um grupo fala "As casa é azuis" e se entende, quem somos para dizer que isso é inaceitável? A discussão é bem interessante :-) – eightShirt Aug 01 '16 at 17:17
  • @eightShirt - Porém não é assim que o registro coloquial funciona. Ele tem regras, às vezes bem rígidas, às vezes até mais rígidas do que as do padrão; elas apenas não foram codificadas num corpus normativo. E uma das regras do português coloquial é uma hierarquia do que vai para o plural. O predicativo do sujeito só vai para o plural se o verbo também for; assim "As casa são azul" é aceitável, "As casa é azuis" não é, embora inteligível. Da mesma forma, aceita-se "tu foi", mas não "você foste". É só usar essas expressões em conversa coloquial, para verificar que os falantes as estranham. – Luís Henrique Aug 01 '16 at 18:05
  • @LuísHenrique O funcionamento de qualquer registro coloquial, seja ele qual for, não impede que um grupo use qualquer uma das construções que consideras inaceitáveis. Assim como o professor Vicente Santos e outros pesquisadores, Ataliba Teixeira de Castilho diz que, "cientificamente, só é errado quando você fala e o outro não entende". Por esta tese, se uma mensagem for compreendida, não estaria configurado um erro. – eightShirt Aug 01 '16 at 18:38
  • Acredito que isso dependa do grupo onde se dá a comunicação, e mantenho o questionamento: se um grupo fala "as casa é azuis" e se entende, quem somos para dizer que isso é inaceitável? A propósito, você poderia citar os autores nos quais se baseia? Gostaria de ter o registro daqueles que contra-argumentam. – eightShirt Aug 01 '16 at 18:38
  • Creio que meu posicionamento é semelhante ao do Mario Alberto Perini, por exemplo em Gramática do Português Brasileiro. A língua coloquial e a língua popular não se caracterizam pela ausência de regras, mas por regras diferentes das do padrão. O "inaceitável" não se reduz ao ininteligível, mas é aquilo que o falante/ouvinte rejeita como "não sendo parte da língua", e é evidentemente contextual. Ainda que você consiga entender o discurso de um estrangeiro que não sabe o gênero das palavras em português, você sabe que "o meu mãe" não é português. – Luís Henrique Aug 01 '16 at 19:15
  • Uma breve nota, @LuísHenrique : numa região grande do nordeste de Portugal (eu diria que em todo o Trás-os-Montes e Alto Douro), ainda se usa a segunda pessoa do plural; «Não vos chamei por que não estáveis ainda prontos.» seria por lá uma frase perfeitamente aceitável e comum, tanto no registo escrito como no registo falado, e tanto no registo informal como no registo formal. – ANeves Feb 23 '18 at 14:53
  • @ANeves - Evidentemente, o coloquial é geograficamente mais variado do que o padrão. Daí ser difícil generalizar - o que é aceitável no coloquial do interior do Rio Grande do Sul pode não ser em Salvador, ou no Faro, ou em Braga. Neste sentido, minhas observações se referem - e se restringem - ao coloquial urbano brasileiro. Mas... diz-se também "táveis" por "estáveis"? :-) – Luís Henrique Feb 23 '18 at 15:48
  • @LuísHenrique atenção que lá o vós tanto é usado coloquial como formalmente. E sim, em discurso coloquial dizem por exemplo "vós tais é malucos, se achais qu'o Portimonense não desce de divisão este ano..." – ANeves Feb 23 '18 at 19:28

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Essa forma (bem como toda uma conjugação paralela do verbo estar, "tou", "tás", "tive", "tiveste", "tavam", "tamos", "taria", "tando") é inaceitável no padrão, mas completamente aceitável (e até preferível, eu diria) no coloquial (registro no qual, portanto, não constitui um "erro"). O mesmo vale para o registro popular, de que é exemplo a tua segunda citação.

Luís Henrique
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