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Eu estava estudando a gramática de algumas línguas românicas e notei uma peculiaridade de como a gramática do português é formalizada, em especial o português brasileiro.

As línguas derivadas do latim têm sistemas de flexão verbal similares, apresentando algumas flexões em comum, como na palavra "cantaría/cantaria", comum ao português, espanhol, galego, etc. Em todas as gramáticas e tabelas de conjugação de todas as línguas românicas que li, tal conjugação chama-se condicional (ou tempo condicional). E.g., no castelhano, no italiano, no romeno, no francês e no português europeu.

Porém, nas gramáticas feitas para o português brasileiro, tal conjugação chama-se futuro do pretérito (enquanto que o tempo futuro passa a se chamar futuro do presente).

  • Por que tal diferença existe na gramática do português brasileiro?
  • Qual é a lógica por trás dos nomes "futuro do presente" e "futuro do pretérito"? (I.e., por que faz sentido atribuí-los às respectivas conjugações?)

Na minha opinião, é muito mais óbvio e intuitivo dizer que "cantarei" e "cantaria" estão no futuro e no condicional, respectivamente, do que em diferentes flexões do tempo futuro.

Seninha
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    Em castelhano, denomina-se também «pospretérito» (é dizer, futuro do pretérito). No asturiano, pode ser quer condicional quer presente do modo potencial. – user0721090601 Jul 07 '17 at 06:53
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    @hugo Maria diz hoje «amanhã farei X», em dois dias, eu poderia dizer «há dois dias, Maria disse-me que faria X ontem». O tempo da narração fica dois dias no passado, mas a ação (de fazer X) ocorre um dia depois, que obviamente está no futuro com respeito ao tempo de narração. – user0721090601 Jul 07 '17 at 07:00
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    Ups, disse que era o presente do potencial no asturiano, que é errado, quis dizer o pretérito do potencial (o presente do potencial é o mesmo do futuro haha) – user0721090601 Jul 07 '17 at 16:55

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Pelo que pude verificar, esta conjugação também era chamada de condicional no Brasil. Porém, a sua denominação foi alterada em 28 de janeiro de 1959, pela Portaria nº 36 do Ministério da Educação e Cultura.

A Portaria baseou-se no trabalho feito por uma comissão de estudiosos (citados no link acima), que sugeriu várias mudanças, entre elas a alteração da denominação de condicional para futuro do pretérito - na página 4 do link acima, na seção VI - Verbo, item c:

c) de tempo: presente; pretérito: imperfeito (simples e composto); perfeito (simples e composto); mais que perfeito (simples e composto); futuro do presente (simples e composto) e do pretérito (simples e composto).
Nota: A denominação futuro do pretérito (simples e composto) substitui a de condicional (simples e composto);

este artigo afirma que Portugal não participou da mudança, embora não mostre evidências do mesmo. Este mesmo artigo ainda sugere uma hipótese para as motivações de tal alteração:

... uma das hipóteses de sua ocorrência pode ter sido o fato de que a condição, nesse caso, não reside no tempo verbal sob análise, mas na estrutura sintática da outra oração como um todo, como é fácil verificar no seguinte exemplo: "Eu compraria uma casa, se tivesse dinheiro".

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Em complemento à resposta de user1798, a lógica em que os nomes se baseiam consiste em diferenciar as ações que ocorrerão futuramente em relação a seus referenciais.

Futuro do presente

O que acontecerá após agora; acontecerá depois, utilizando como referencial o presente.

"Ele fará o dever de casa.". Neste exemplo, 'ele' fará depois, depois de agora, isto é, o presente.

"Amanhã eu irei à praia.". Amanhã é posterior ao presente e ao passado, porém o presente tem prioridade, pois algo que ocorre posterior ao passado referenciado mas antes do presente seria futuro do pretérito.

Futuro do Pretérito

O que acontecerá após o passado e antes do presente, algo que ocorreria em um tempo futuro àquele que estamos narrando ou referenciando; ou algo que iria se desenrolar se uma condição presente/passada fosse/tivesse sido diferente.

"O garoto deparou-se com uma grande entrada, na qual ele entraria após perceber que ela o levaria a seu destino.". Após deparar-se com a entrada, o garoto entrou; tudo isso ocorreu no passado, porém a entrada do garoto foi depois da deparação.

"Eu jogaria com ele se não estivesse chovendo.". Se água não estivesse caindo do céu agora, o jogo aconteceria.

"Eu teria jogado com ele se não estivesse chovendo.". A oportunidade de jogar e a chuva naquele momento já passaram. Se água não estivesse caindo do céu no passado, o jogo teria acontecido nesse mesmo passado.