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Segundo o PDF com a letra oficial disponibilizado no site do Planalto (aqui), a primeira estrofe do Hino Nacional do Brasil é a seguinte:

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas 
De um povo heróico o brado retumbante, 
E o sol da liberdade, em raios fúlgidos, 
Brilhou no céu da pátria nesse instante.

Pergunto: Quem ouviu, quem falou, o que foi que ouviu, o que foi que falou e onde estava quem ouviu e quem falou ?

Repare que na letra oficial a palavra "as" (antes de "margens" ) não tem acento.

Informo ainda que tenho essa dúvida há muitos anos e ela já foi tema de inúmeros debates que tive, por isso já fui ver a letra no site do Planalto em outras ocasiões e em várias outras administrações, então não é erro na letra devido ao atual momento político ou algo assim. Imagino que o Planalto seja a autoridade máxima em dizer qual a letra oficial do Hino do Brasil. Entretanto, se houver alguma controvérsia a respeito e houver outra versão dessa estrofe ou uma autoridade superior para dizer qual a letra oficial estou querendo saber também.

Adicionalmente, se alguém conseguir além de responder as perguntas escrever essa estrofe em português coloquial seria excelente.

stafusa
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Nelson Teixeira
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  • Toda a gente sabe mas já gora: "quem falou?" - D Pedro I. "quem ouviu?" - toda agente (alguns dos quais ouviram contar). "O que foi que ouviu?" - o grito do Ipiranga = "É tempo, Independência ou morte". "Onde?" - Margens do Ipiranga, 1822 – JJoao Apr 23 '22 at 19:39

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Aprovação do Hino Nacional

O órgão responsável pela aprovação do Hino Nacional Brasileiro foi o poder legislativo, que, em 6 de setembro de 1922, assinou o decreto 15.671. O decreto foi assinado por Epitacio Pessôa, que na época era senador eleito pela Paraíba.

Ouviram do Ypiranga as margens placidas
De um povo heroico e brado retumbante
E o sol da liberdade, em raios fulgidos,
Brilhou no céo da Patria nesse instante.

Figura de Linguagem

Hipérbato

É bastante comum que as pessoas errem quanto à classificação sintática dos termos do Hino Nacional, isto se deve ao fato de ele estar na ordem indireta, conhecida também como hipérbato.

Esta figura de linguagem é caracterizada pela inversão da ordem direta dos termos da oração, que é composta por: [sujeito +] verbo [+ complementos verbais + adjuntos].

Exemplos:

┌────────────────────────────────────────────────────┬────────────────────────────────────────────────────┐
│ Hipérbato                                          │ Ordem Direta                                       │
├────────────────────────────────────────────────────┼────────────────────────────────────────────────────┤
│É difícil para mim aprender gramática               │ Aprender gramática é difícil para mim              │
├────────────────────────────────────────────────────┼────────────────────────────────────────────────────┤
│Em meu sangue a América se nutre                    │ A América se nutre em meu sangue                   │
├────────────────────────────────────────────────────┼────────────────────────────────────────────────────┤
│Há dois mil anos te mandei meu grito                │ Mandei-te meu grito há dois mil anos               │
├────────────────────────────────────────────────────┼────────────────────────────────────────────────────┤
│Gravai com Buril nos pátrios anais o vosso poder    │ Gravai o vosso poder com Buril nos pátrios anais   │
├────────────────────────────────────────────────────┼────────────────────────────────────────────────────┤
│Quando alguém te destruir, se reconstrua com sua fé │ Reconstrua-se com sua fé quando alguém te destruir │
└────────────────────────────────────────────────────┴────────────────────────────────────────────────────┘

Personificação / Prosopopeia

A figura de linguagem prosopopeia também é conhecida pelos nomes personificação, animização e antropomorfismo. Toda vez que atribuímos atitudes e sentimentos a seres inanimados, pessoas já falecidas, animais, fenômenos da natureza ou figuras imaginárias, estamos criando uma prosopopeia. fonte

Exemplos:

┌───────────────────────────────────┬─────────────────────────────────────────────────┐
│Hoje até o sol está mais feliz.    │ O sol é uma estrela, não fica feliz nem triste. │
├───────────────────────────────────┼─────────────────────────────────────────────────┤
│As flores estão dançando ao vento. │ Flores não dançam, o vento é que as agita.      │
└───────────────────────────────────┴─────────────────────────────────────────────────┘

Análise do Hino Nacional

A figura de linguagem supra é bastante utilizada e está em toda parte do Hino Brasileiro. Para exemplificar melhor, faremos uma análise sintática dos termos.

    ┌─────────────────────────────────────── Verbo Transitivo Direto
    │                      ┌──────────────── Sujeito Simples
┌───┴───┐ ┌────────────────┴──────────────┐
│Ouviram│ │do Ipiranga as margens plácidas│
└───────┘ └───────────────────────────────┘
          ┌────────────────────────────────── Adjunto Adnominal de Brado
          │                    ┌───────────── Objeto Direto do verbo Ouviram
┌─────────┴────────┐ ┌─────────┴─────────┐
│De um povo heroico│ │o brado retumbante.│
└──────────────────┘ └───────────────────┘

Feita a análise sintática, podemos pôr a oração na ordem direta, ficando desta forma:

As margens plácidas do Ipiranga ouviram o brado retumbante de um povo heroico.

Podes ater achar estranho o fato das margens ouvir. Isso acontece pois nos deparamos com outra figura de linguagem, a personificação.

Esta oração quer dizer que quando Dom Pedro disse a célebre frase, o brado (=grito) do o povo foi tão retumbante (=forte e alto) que até as margens do Ipiranga ouviram-no (figura de linguagem).

Mais informações

https://github.com/valdeir2000/pt-br/blob/master/answers/6015.md

Valdeir Psr
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  • Então... Essa é outra forma de entendimento que já ouvi algunas vezes. O problema dessa análise é que o brado foi dado "ao vento", para as margens. Ora, quem é que vai bradar pra um lugar que não tem ninguém? Só as margens ouviram o brado? Ou o povo bradou pra si mesmo por alegria e as margens ouviram? É meio estranho uma margem ouvir. Até entendo que pode ser uma personalização da margem dando una nobreza ao local, mas que é estranho personalizar uma margem é. – Nelson Teixeira Jun 01 '19 at 18:46
  • Vc sabe de algum documento oficial que corrobore a hipótese do hipérbato? – Nelson Teixeira Jun 01 '19 at 18:50
  • Além disso nessa versão citada vc colocou "e brado" ao invés de "o brado". Onde vc encontrou essa versão? – Nelson Teixeira Jun 01 '19 at 18:52
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    @NelsonTeixeira adicionei a figura de prosopopeia, que explica o fato das margens ouvirem. No site do Senado há a informação sobre o hino e o hipérbato (apesar disso, a grande maioria dos gramáticos entendem dessa forma). Coloquei e brado, pois foi dessa forma que ele foi oficializado em 1922. O hino (Versão 1922) está disponível na Câmara – Valdeir Psr Jun 01 '19 at 19:08
  • Excelente. Com essas fontes oficiais, considero explicado. Gratidão. – Nelson Teixeira Jun 01 '19 at 19:16
  • Idéia: seria bom colocar esses 2 links no corpo sua resposta – Nelson Teixeira Jun 01 '19 at 19:20
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    Exatamente: e se você estivesse naquelas margens, também teria ouvido. No fundo, o fato que as margens ouviram inclui qualquer pessoa que estivesse lá naquele momento. Ou seja: o brado retumbante de um povo heroico se ouvia na margens do Ypiranga. Para manter o efeito poético e mêtrico, foi preciso dar às margens um papel humano (a prosopopeia) e era impossível pronominalizar o verbo da frase, né? O verso não teria funcionado. Esse é o jeitinho da coisa. – Lambie Jun 04 '19 at 00:01
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Resposta curta, conforme aprendi no curso primário:

  • Quem ouviu - foram as margens plácidas
  • Quem falou (bradou) - foi um povo heróico
  • O que foi ouvido - o brado retumbante
  • O que falou (bradou) - algo que não é citado nesse parágrafo, e que nos ensinaram ter sido "Independência ou Morte"
  • Onde estavam quem ouviu e quem falou - quem ouviu foram as próprias margens do riacho. Portanto, quem falou (bradou) estava em suas proximidades.

Uma vez que não há ocorrência de crase em "as margens plácidas", o parágrafo pode ser re-escrito da seguinte forma:

"As margens plácidas do (riacho) Ipiranga ouviram o brado retumbante de um povo heroico, enquanto o sol da liberdade brilhava no céu da pátria em raios fúlgidos."

Caso o autor tivesse colocado um acento grave em "as margens", mudaria o sentido para "Alguém que estava próximo, ou aqueles que estavam junto as margens do riacho Ipiranga, ouviram o brado retumbante..."

Mais detalhes em

Hino Nacional Brasileiro

Você entende a letra do Hino Nacional Brasileiro

Hino Nacional explicado tim-tim por tim-tim

Centaurus
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  • Quanto à parte onde vc diz o que foi falado, há controvérsias. No resto vc está certo porque o @Valdeir Psr apresentou as provas que assim é. Mas se quiser, leia os comentários que eu coloquei em outras respostas pra ver que não é tão simples e que essas afirmações precisam ser corroboradas por uma fonte oficial ou podem ser entendidas de várias outras formas. – Nelson Teixeira Jun 02 '19 at 00:47
  • @NelsonTeixeira Antigamente a letra do Hino Nacional era ensinada e explicada no curso primário de todas as escolas públicas do país. (não sei se ainda é assim). Mais tarde, no ginásio, aprendíamos fazer sua análise sintática. Minha resposta começa com "conforme aprendi no curso primário", ou melhor, conforme determinava o Ministério da Educação na época. Referências, eu as acrescentei no final. – Centaurus Jun 02 '19 at 01:08
  • Sim, mas no caso essas páginas que colocou como referência, assim como seus professores não têm qualquer autoridade para dizer qual a interpretação correta, já o Planalto, Congresso e Senado têm sim autoridade pra isso. Além disso, no caso de sala de aula não pise haver a certeza da letra apresentada ser a correta. Por isso falei das referências nos comentários da outra responsta que eu aceitei. Porque citavam fontes oficiais que corroboram o que foi dito e não páginas que podem ter opiniões diversas. – Nelson Teixeira Jun 02 '19 at 01:14
  • @NelsonTeixeira Considero encerrada aqui essa discussão infrutífera. Se quiser discutir em sala de Chat estarei à sua disposição. – Centaurus Jun 02 '19 at 01:44
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Não havendo acento, as margens plácidas poderiam ser ou sujeito ou objeto direto (respetivamente as margens ouviram ou foram ouvidas). Mas avançando para o verso seguinte, encontramos o brado retumbante, que está no singular, enquanto o verbo está no plural, pelo que o brado retumbante só pode ser objeto direto (semanticamente, também faz mais sentido termos um brado que é ouvido) e as margens plácidas só pode ser então sujeito. Por isso, a frase equivale a, numa ordem mais normal:

As margens plácidas ouviram, (vindo) do Ipiranga, o brado retumbante de um povo heróico.

Artefacto
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  • O Ipiranga é um córrego na cidade de São Paulo. Sendo assim, o povo que deu o brado estaria dentro do córrego ? – Nelson Teixeira Jun 01 '19 at 13:33
  • Estou fazendo essa pergunta pq algumas pessoas argumentam que no 1o verso haveria uma inversão e a ordem correta seria "ouviram as margens plácidas do Ipiranga". Por essa compreensão não caberia o "vindo do". – Nelson Teixeira Jun 01 '19 at 18:09
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Opa, infelizmente não vou poder te dar em detalhes semânticos do que está rolando ali.(minha gramática não é tão boa) Porém, creio eu, que deva se levar em consideração, não apenas a letra, mas também como se é cantado, afinal é um hino. Tendo isso em mente, o que foi ouvido, foram as margens plácidas(que remete ao sossego do rio) e o brado retumbante(que poderia remeter ou aos indígenas assassinados - em uma tentativa de dar valor aos oponentes sobre a vitoria do 'povo brasileiro'. Ou aos combatentes do lado vitorioso). Sei que não foi tão conciso quanto gostaria, mas espero ter contribuído de alguma forma.

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Bem vou aqui dar minha contribuição para tal dilema, vamos supor que o autor desta letra queria dizer o seguinte: "Algumas (ou muitas) pessoas ouviram às margens plácidas do Ypiranga o brado retumbante de um povo heroico, e o sol da liberdade brilhou no céu da pátria em raios fúlgidos, neste instante." Uma vez observando este meu ponto de vista, o sujeito aqui seria indeterminado, e "as margens plácidas" seria um adjunto adnominal relativo ao rio Ypiranga. Foi assim que aprendi com minha professora de português na década de 1980 onde se ensinava português, literatura e redação, e hoje o que é ensinado????

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    Wellerson, muito obrigado pela contribuição, mas há um grande erro na tua interpretação, que é *às margens plácidas, sendo que a versão oficial e original é as margens plácidas*. Por sinal, na última que chequei, hoje se ensinam gramática, literatura e redação no Ensino Médio... – Schilive Apr 16 '22 at 21:11
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    Olá Wellerson, bem-vindo ao Portuguese SE. Obrigado pela contribuição, mas note que o autor da pergunta deixou bastante claro (e em negrito) que "as margens" não leva crase, o que compromete tua interpretação. E seu comentário/pergunta final é desnecessário e uma distração indesejável. – stafusa Apr 16 '22 at 21:12