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Para fazer uma pergunta no português falado é preciso mudar a entonação da frase. Isso não acontece em línguas como inglês, que possuem artifícios gramaticais como a inversão do verbo e do sujeito. Por exemplo:

You like. / Do you like?

Você gosta. / Você gosta?

Na escrita temos o ponto de interrogação, porém na fala temos somente a entonação, já que frases afirmativas e interrogativas são iguais no português.

Existe alguma regra para essa entonação? Foneticamente falando, o que seria a entonação de uma pergunta em português? Tem como fazer uma pergunta sem mudar a entonação, mas utilizando algum artifício gramatical, como no inglês?

ANeves
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    Eu diria que no inglês também há uma entonação típica, apenas não tão realçada como em português. – stafusa Aug 12 '19 at 22:48
  • Sobre fazer perguntas em português sem entonação, há algumas possibilidades (a partir do contexto sozinho; com gestos; e são claramente perguntas em contextos usuais: "você teria um real para me emprestar"; "você tem um irmão, não"; etc.), mas normalmente o falante nativo vai usar a entonação de pergunta. – stafusa Aug 12 '19 at 22:52

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Em se falar da prosódia de frases interrogativas no português, é conveniente dividi-las em algumas classes. Temos:

  • Interrogativas totais, onde a interrogação recai sobre a frase inteira, e portanto admite como resposta somente sim, não ou talvez (ou construções equivalentes). Exemplos:

    • Queres ir ao cinema?
    • Você gosta de comer comida japonesa?
    • A tia do Antônio melhorou da gripe?
    • Eu vou receber alta hoje, doutor?

    Em todos os casos, a entoação sobe ao longo da frase para chegar a um ápice na última sílaba tônica, podendo ou não haver um pico secundário na sílaba tônica do verbo finito (isto é, aquele que é conjugado para pessoa). Também há de se notar que se houver um vocativo no fim da frase — como no quarto exemplo — o vocativo não é considerado como parte da interrogação: no caso, a sílaba mais aguda seria então o ho de hoje, não o tor de doutor.

    Um subtipo das interrogações totais são as interrogações «tag» (tag questions em inglês), onde a frase é enunciada como declarativa, e ao final se anexa uma «tag» composta pelo verbo finito com a polaridade invertida, e com a sílaba tônica deste segundo verbo bem mais aguda que o resto da frase:

    • Você já foi à Bahia, não foi?
    • O Juca não chegou a conhecer o avô, chegou?
  • Interrogativas disjuntivas, em que se apresenta uma lista de opções das quais o ouvinte deve selecionar uma. Exemplos:

    • Você prefere vinho ou cerveja?
    • O azul na bandeira da França corresponde à liberdade, à igualdade ou à fraternidade?
    • Afinal de contas, tu provaste o camarão ou não provaste?

    Nestes casos, o tom mais agudo é usado nas sílabas tônicas de cada opção, exceto a da última, que ganha um tom um pouco menos agudo, mas ainda bastante diferente do resto da oração.

  • Interrogativas parciais, que são marcadas por um pronome interrogativo, sobre cuja sílaba tônica recai o tom mais agudo da frase. No português, o pronome interrogativo pode ser movido para o princípio da frase, mas não necessariamente. Se houver mais de um pronome interrogativo, somente um pode ser movido. Exemplos:

    • Queres ir aonde? ou: Aonde queres ir?
    • Você gosta de comer que tipo de comida? ou: Que tipo de comida você gosta de comer?
    • Quem melhorou da gripe?
    • Eu vou receber alta quando, doutor? ou Quando eu vou receber alta, doutor?

Além desta classificação, pode-se classificar as frases interrogativas como diretas ou indiretas. Todos os exemplos acima são diretos, onde a interrogação é feita diretamente. Na interrogação indireta, a frase interrogativa se torna uma oração subordinada a uma outra, afirmativa ou negativa; no caso de a interrogação ser total ou disjuntiva, ela é introduzida pela conjunção se; no caso de uma interrogação indireta, o pronome interrogativo é deslocado à extremidade esquerda da oração:

  • Não sei se queres ir ao cinema.
  • Gostava de saber se você gosta de comer comida japonesa.
  • Você deve saber de que a tia do Antônio melhorou.
  • Não me disseram quando eu vou receber alta, doutor.

A prosódia das perguntas indiretas é sempre igual à das frases afirmativas ou negativas que lhes dão apoio. Suponho que este é o máximo de artifício "gramatical" que se pode arranjar para não depender da prosódia para marcar as frases interrogativas; certamente as palavras que marcavam interrogações em latim clássico como an, nonne, num e -ne não existem no português moderno.

Fontes:

Wtrmute
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