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As palavras "nascer", "crescer", "descer", etc vêm do galego-português "nacer", "crecer", "decer" etc e eram, como se pode deduzir, faladas com a africada /t͡s/, que no português passou a ser /s/ e assim foi passada para o Brasil.

Teria a pronúncia portuguesa de tais palavras (com /-ʃ.ˈs-/) sido causada por uma relatinização tardia de tais palavras? Se não o for, como pode ter acontecido tal mudança?

Ergative Man
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    @Schilive Creio que nascer será /nɐʃˈseɾ/ no Portugal e /nɐʃˈθeɾ/ na Galiza, mas não tenho boas referências em este momento. – tchrist Feb 14 '21 at 14:18
  • @tchrist, bom lembrarmo-nos que faz mais de 500 anos desde que o galego e o português se separaram, e que houve influência do espanhol em galego. Antes de tirarmos conclusões, teríamos que ver isso melhor. Um problemão de vê-lo melhor é a falta de coisas escritas em galego. Sem falar que o português brasileiro não chia majoritariamente seus as. Ou seja, é complicado, mas interessantíssimo. Obrigado. – Schilive Feb 14 '21 at 14:29
  • @Schilive , sabe dizer em qual texto de Teyssier especificamente? – Ergative Man Feb 14 '21 at 16:34
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    Ergative Man, sim. Livro “história da língua portuguesa” por Paul Teyssier, traduzido por Celso Cunha. – Schilive Feb 14 '21 at 17:16
  • Talvez tenha algo a ver com isso? Acho que mencionam o português um pouco lá. – tchrist Feb 14 '21 at 20:28
  • @Schilive, revê lá o teu Teysser. A Gramática do Português diz que o /t͡s/ (como em paço) deu em /s/ alveolar pré-dorsal (imagino que mais ou menos o mesmo que pré-dorsodental); o s de passo é que era já do latim /s/ apicoalveolar; vê esta pergunta. Com /t͡s/ → /s/ aveolar pré-dorsal, em nascer ficariam duas consoantes parecedíssimas juntas (apicoalveolar seguida de alveolar pré-dorsal). Pergunto-me se o chiamento não >> – Jacinto Feb 14 '21 at 20:54
  • começaria nalgumas zonas antes da passagem /t͡s/ → /s/ aveolar pré-dorsal, evitando assim a assimilação de um /s/ pelo outro. Se foi isto começaríamos a ter uma resposta para esta pergunta relacionada, e encalhada há anos. Ou talvez eu esteja a subestimar a agilidade da língua e fineza do ouvido, e nós sejamos perfeitamente capazes, se treinados de pequeninos, de produzir e ouvir o apicoalveolar seguido do pré-dorsal.

    – Jacinto Feb 14 '21 at 21:01
  • Em glossa.gal, todas as palavras com "sce" ou "sci" podem ser "ce" ou "ci", logo me parece que havia duas possibilidades de pronúncia, i.e., havia "nascer" e "nacer". Os /ts/ haviam se transformado em /s/ pré-dorsodentais, início do século 1500, mantendo a distinção entre "acender" e "ascender", mas em 1550, vê-se que há falantes confundindo os dois; em 1600, essa distinção morre — com excessão do norte português —, /s/ pré-dorsodentais se tornam /s/ ápico-alveolares. Quando e como esse chiamento aconteceu? De acordo com Teyssier, não temos certeza. Porém, as coisas PODEM ter mudado. – Schilive Feb 14 '21 at 22:00
  • @Schilive, o pessoal a trocar os passos pelos paços (o apicoalveolar passar a alveolar pré-dorsal, o som do ç, ss atuais), diz a Gramática do Português que já acontecia no século XIII em Lisboa e no Algarve (vê a primeira das perguntas que eu linkei). – Jacinto Feb 14 '21 at 22:03
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    @Schilive, essa é uma hipótese que eu menciono nos meus primeiros dois comentários. Sistematizando. Símbolos: asso /s̺/; aço /t͡s/ → /š/; acho /ʃ/. Então, a tua sugestão é, para nascer /nɐs̺t͡seɾ/ → /nɐs̺šeɾ/ → /nɐʃšeɾ/. É possível. Mas como já disse acima, /s̺/ e /š/ são muito parecidos, e pergunto-me se um deles não reria rapidamente assimilado pelo outro (foi talvez isso que aconteceu na pronúncia não chiada: /nɐs̺t͡seɾ/ → /nɐs̺šeɾ/ → /nɐšeɾ/). >> – Jacinto Feb 15 '21 at 08:29
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    A outra hipótese que eu adiantei acima é /nɐs̺t͡seɾ/ → nɐʃt͡seɾ/ → /nɐʃšeɾ/; ou seja o chiamento apareceria primeiro; como /ʃ/ e /š/ são mais diferentes (do que /s̺/ e /š/) , não haveria tanta pressão para assimilação. Há falantes no norte de Portugal que preservam a distinção entre /s̺/ e /š/ (pelo menos ainda havia no final do sXX; felizes, porque sabem sempre se se escreve cegar ou segar; já eu por vezes me engano!), mas não, que eu saiba, com os dois sons contíguos. Mas respondendo ao Ergative, não creio mesmo nada que tenha sido /nɐšeɾ/) → /nɐʃšeɾ/. >>

    – Jacinto Feb 15 '21 at 08:39
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    Até porque, uma coisa é relatinação de palavras mais cultas como opoente → oponente ou sutil → (em Portugal) subtil. Mas com palavras populares como nascer, descer, crescer ??

    – Jacinto Feb 15 '21 at 08:47
  • Interessante que hoje falamos “padecer”, mas lat. *“patescere” > port. arc. “padescer” > port. hodierno “padecer”. Então nem todas as palavras que se falavam “stse” (“sce”) ou “stsi” (“sci”) são faladas como “chse” ou “chsi”. – Schilive Feb 15 '21 at 21:53
  • Procurei várias coisas, mas sem conclusão certa. 1. Vendo no Wikcionário os descendentes naturais de nasco, cresco, descendo, -sco (incoativo), misceo, piscem, fascem: talvez português seja a única língua ibérica que preserva o som SÇ /s̺s/ (hoje /ʃs/), que tipicamente se torna Ç /s/ (-ecer; esp. mecer, pez /s→θ/) ou X /ʃ/ (mexer, peixe, feixe; cat. néixer, créixer, aparèixer; arag. naxer, crexer confiando no Wikcionário); logo comparar com os vizinhos é difícil. 2. Uns poucos escritores medievais usavam SÇ, mas talvez fosse só por amor ao latim. (continua...) –  Sep 08 '23 at 13:25
  • (…continuando) 3. Uma relatinização talvez repusesse o som SÇ, mesmo em palavras populares, assim como chor→flor, fruito→fruto, auto→ato. 4. -ecer é justificável nambos casos: se SÇ era pronunciado, a simplificação SÇ→Ç aconteceria talvez em palavras mais longas ou com outra condição; se SÇ não era assim pronunciado, talvez não ajustaram -ecer porque muitas dessas palavras eram incomuns ou inexistentes no latim clássico (p.ex., esquecer e parecer de *excadescere e *parescere, nunca escritos; já apparescere aparece poucas vezes). Portanto, nenhuma conclusão. –  Sep 08 '23 at 13:30

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Schilive escreveu em um comentário:

Em glossa.gal, todas as palavras com "sce" ou "sci" podem ser "ce" ou "ci", então, me parece que havia duas possibilidades de pronúncia, i.e., havia "nascer" e "nacer". Os /ts/ haviam se transformado em /s/ ápico-alveolares, início do século 1500, mantendo a distinção entre "acender" e "ascender", mas em 1550, vê-se que já há falantes confundindo os dois; em 1600, essa distinção morre, /s/ ápico-alveolares se tornam /s/ pré-dorsodentais. Quando e como esse chiamento aconteceu? De acordo com Teyssier, não se tem certeza, não sabemos.

tchrist
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